Meu embrião tem baixa qualidade, vale a pena transferir?
26 mar, 2021
Desde o início do desenvolvimento das tecnologias de cultivo embrionário, tem-se buscado formas de classificar os embriões para escolher o melhor para ser transferido. Após quase 42 anos do nascimento do primeiro bebê de FIV, sabemos algumas características comuns em embriões que apresentam um maior potencial, entretanto, embriões de baixa qualidade também são capazes de evoluir em uma gestação, mesmo que em menor proporção.
Os métodos de classificação embrionária rotineiramente utilizados nas clínicas de reprodução levam em consideração características do embrião observadas em microscópio, que juntas formam o que chamamos de “morfologia embrionária”. Mesmo utilizando diferentes sistemas pra classificá-los, os embriologistas avaliam normalmente as mesmas características básicas dos embriões conforme o dia de desenvolvimento:
- Embriões em estágio de clivagem (dia 3 de desenvolvimento): são avaliados o número de células, a simetria entre elas e a porcentagem de fragmentação;
- Embriões em estágio de blastocisto (dia 5 de desenvolvimento): são avaliados o grau de expansão, a qualidade do embrioblasto (aglomerado de células que darão origem ao feto) e a qualidade do trofoblasto (células que darão origem à placenta).
Essas avaliações geram uma espécie de nota para cada embrião, sendo que os mais pontuados, tem uma melhor qualidade e um maior potencial de implantação. Da mesma forma, embriões com classificações melhores apresentam menos alterações genéticas e têm maiores chances de se tornarem um bebê quando comparados aos de “baixa qualidade”. Portanto, na hora da transferência dos embriões para a paciente, deve-se priorizar aqueles com uma melhor classificação.
Porém, essa metodologia não é capaz de dizer 100% a chance deste embrião se tornar uma bebê. Embriões de “baixa qualidade” nessas classificações têm também potencial e devem ser transferidos quando a paciente não tem outros disponíveis. Alguns trabalhos mostram que após a biópsia embrionária, aproximadamente 25% dos embriões de baixa qualidade eram geneticamente normais e após a transferência, implantaram com ótimas taxas, mostrando a importância de não descartá-los. Além disso, embriões que se desenvolvem mais lentos, chegando ao estágio de blastocisto no dia 6 ou 7 de cultivo, também podem ser euploides (geneticamente normais) e apresentam taxas de implantação semelhantes aos de dia 5. O embrião é muito mais do que podemos avaliar em uma foto. A real qualidade dele está relacionada também com a sua constituição genética, epigenética, com o seu metabolismo, o tempo das divisões, entre outros parâmetros. Além disso, para que uma gestação ocorra é necessário mais do que um embrião de excelente qualidade. O útero tem que estar receptivo para recebê-lo, deve ter capacidade de reconhecê-lo e de manter essa gestação.
Então o ponto importante aqui é: embora a “beleza” do embrião seja importante, não se apegue somente a isso na hora de decidir a tranferência. A potencialidade da vida é incrível e nós, embriologistas, estamos cheios de histórias de embriões que foram classificados como “baixa qualidade morfológica” e se tornaram lindos bebês. Então, acredite no potencial do seu embrião! Vale a pena transferir embriões de baixa qualidade, sempre discutindo com a sua equipe médica e avaliando as chances de realizar o seu sonho.
Msc. Letícia Arruda
Referências: Capalbov A. et. al., Correlation between standard blastocyst morphology, euploidy and implantation: an observational study in two centers involving 956 screened blastocyst. Human Reproduction, Vol.29, No.6 pp. 1173–1181, 2014.