MORFOLOGIA DOS BLASTOCISTOS E ANEUPLOIDIA

26 set, 2024

Por: Eduardo Gomes Sá

 

A qualidade dos blastocistos é um fator crucial na medicina reprodutiva, especialmente no contexto da fertilização in vitro (FIV). A morfologia do blastocisto, que inclui a forma, a estrutura e o desenvolvimento do embrião, é frequentemente utilizada para avaliar sua viabilidade. No entanto, a questão de saber se blastocistos com morfologia ruim são necessariamente aneuplóides — ou seja, se possuem um número anormal de cromossomos — é complexa e merece uma análise detalhada. Neste artigo, vamos explorar a relação entre a morfologia dos blastocistos e a aneuploidia, e discutir se uma morfologia ruim é um indicador confiável de anomalias cromossômicas.

Os blastocistos são embriões que se encontram em um estágio avançado de desenvolvimento, geralmente entre cinco e seis dias após a fertilização. Neste estágio, o embrião possui uma estrutura complexa composta por uma cavidade central (blastocele), uma camada externa de células (trofoblasto) e uma camada interna de células (massa celular interna). A avaliação da morfologia do blastocisto envolve a observação de vários aspectos, como a expansão da blastocele, a uniformidade e a integridade do trofoblasto e a presença de fragmentação ou outras anomalias.

Aneuploidia refere-se a um número anormal de cromossomos em uma célula. Em seres humanos, as células possuem 46 cromossomos, organizados em 23 pares. A aneuploidia pode ocorrer devido a erros na divisão celular e pode levar a condições genéticas como a síndrome de Down (trissomia do cromossomo 21) ou outras síndromes cromossômicas. No contexto da fertilização in vitro, a aneuploidia é uma causa comum de falhas na implantação e abortos espontâneos.

Blastocistos com morfologia ruim, como aqueles com blastocele não expandida, fragmentação excessiva ou trofoblasto irregular, frequentemente são considerados menos viáveis. No entanto, uma morfologia ruim não garante necessariamente que o blastocisto seja aneuplóide. A morfologia pode ser afetada por vários fatores além da aneuploidia, como condições subótimas de cultivo, estresse ambiental ou variações naturais no desenvolvimento embrionário.

Estudos demonstram que há uma correlação entre a morfologia ruim dos blastocistos e uma maior probabilidade de aneuploidia, mas essa relação não é absoluta. A biópsia embrionária e o diagnóstico genético pré-implantacional podem identificar anomalias cromossômicas com precisão, independentemente da morfologia. Portanto, enquanto a morfologia ruim pode indicar um risco aumentado de aneuploidia, mas a confirmação genética é necessária para uma avaliação precisa.

Nem todos os blastocistos com morfologia ruim são aneuplóides. Há casos em que blastocistos com uma aparência morfológica subótima podem ser geneticamente normais e, inversamente, blastocistos com morfologia aparentemente ideal podem ter anomalias cromossômicas. A variabilidade natural nos embriões e a complexidade dos processos biológicos tornam a previsão baseada apenas na morfologia uma abordagem incompleta.

Embora a morfologia dos blastocistos forneça informações valiosas, a decisão sobre a transferência embrionária deve ser baseada em uma combinação de fatores. A avaliação morfológica deve ser complementada por testes genéticos, especialmente em casos de embriões com características morfológicas preocupantes. Isso ajuda a aumentar as taxas de sucesso e reduzir o risco de anomalias genéticas.

O avanço das tecnologias de imagem e análise genética tem permitido uma melhor compreensão da relação entre morfologia e genética. Técnicas como a sequenciação de próxima geração (NGS) têm melhorado a precisão na detecção de anomalias genéticas, mesmo quando a morfologia dos blastocistos é subótima.

A relação entre a morfologia dos blastocistos e a aneuploidia é complexa e não pode ser estabelecida de forma definitiva apenas com base na aparência morfológica do embrião. Enquanto blastocistos com morfologia ruim podem ter uma maior probabilidade de anomalias cromossômicas, a confirmação genética é essencial para uma avaliação precisa. A combinação de avaliação morfológica e análise genética permite uma abordagem mais completa e informada na seleção de embriões para transferência, contribuindo para o sucesso dos tratamentos de fertilidade com um bebê saudável em casa.

 

REFERÊNCIAS:

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