Abandono de embriões: o que fazer?

13 fev, 2023

As técnicas de RHA têm evoluído bastante no decorrer dos últimos anos, trazendo benefícios diversos aos casais inférteis que procuram um Centro de Reprodução Assistida.

Um dos avanços tecnológicos mais importantes, foi o procedimento de criopreservação de gametas e embriões, que trouxe novas oportunidades durante o tratamento de infertilidade, ao mesmo tempo gerando discussões éticas e morais.

A quantidade de embriões congelados sem um destino final é, atualmente, um dos principais problemas a serem contornados, pois muitos casais em tratamento obtêm mais de um embrião durante a jornada em um serviço de RA.

Existe uma tendência de, após um tratamento de reprodução assistida bem-sucedido, a maioria dos casais não requisitar seus embriões excedentes, fazendo com que eles entrem no status de abandono (SIMOPOULOU et al., 2019). Além disso, situações como divórcio e óbito podem dificultar a utilização dos embriões criopreservados, fazendo com que o armazenamento deles seja mais prolongado e regado de burocracias, favorecendo, portanto, a desistência de lutar por eles (LIMA et al., 2019). É considerado abandono quando o paciente cessa o pagamento pelo armazenamento de seus embriões sem instruções prévias, quando não atualiza suas informações de contato na clínica e mesmo após várias tentativas de localização, o paciente continua inacessível (ASRM, 2013).

É importante levar em consideração a falta de conscientização dos pacientes perante à ideia de criopreservação e a possibilidade do abandono. Diante deste cenário, é extremamente importante e se faz necessário, um acompanhamento psicológico ao paciente/casal durante o período de tratamento, pois é neste momento que o casal terá abertura para falar sobre seus sentimentos e inseguranças de uma forma mais profunda ao mesmo tempo em que se torna mais consciente. O diálogo aberto entre médico-paciente também é muito importante para agregar a ele conhecimento e deixá-lo o mais ciente possível a respeito do tratamento e de suas consequências.  Ajudar o paciente a entender quais são os seus valores e como eles influenciam a sua visão a respeito dos embriões criopreservados se torna um facilitador na hora de decidir qual destino dar aos seus embriões (LIMA et al., 2019).

Em hipótese alguma as clínicas podem interferir na decisão do casal, apenas informar detalhadamente quais os possíveis destinos para seus embriões excedentes e solicitar aos pacientes que preencham um documento por escrito especificando o que eles desejam que seja feito com seus embriões (ABREU et al., 2021; CATTAPAN; BAYLIS, 2015). Um problema a respeito disso é que algumas clínicas podem fornecer um Termo de consentimento sem orientações claras sobre o uso ou descarte dos embriões congelados.

É muito importante que o diálogo entre Clínica e Paciente seja extremamente assertivo e detalhado, ou seja um foco evidentemente maior deve ser dado a questão da informação. Entretanto, mesmo quando há instruções adequadas as clínicas ficam relutantes em pôr em prática o que foi definido previamente caso não consigam entrar em contato com o paciente, tentando se resguardar de possíveis conflitos futuros. O ideal para reduzir a incerteza da validade desses documentos é transformar o entendimento do formulário de consentimento em um contrato com o paciente e colocá-lo em prática quando necessário. Outra forma de resguardar as clínicas à situação do abandono é existindo uma regulamentação de tempo máximo de armazenamento dos embriões, onde os casais estão cientes de que em determinado momento, caso não seja referendado um destino, seus embriões serão inseridos no status de abandono podendo então ocorrer o procedimento de descarte (CATTAPAN; BAYLIS, 2015; LAN et al., 2020). Porém, a Resolução vigente hoje no Brasil (CFM n° 2.320/2022) não delimita um tempo máximo de armazenamento dos embriões excedentes. Diversas Clínicas utilizam como ponto central quanto ao descarte a Lei de Biossegurança (artigo 5º da Lei 11.105/2005) no qual declara que após no mínimo 3 anos de armazenamento os embriões podem ser utilizados para pesquisa, com a expressa autorização dos genitores, não sendo citado especificamente o destino de descarte dos embriões.

Portanto de forma prática os casais podem:

  • Descartar os embriões excedentes observando a ótica dos 3 anos de criopreservação, sendo importante a formatação de um Termo de Descarte com as devidas assinaturas dos mantenedores dos embriões, externando a vontade da não utilização dos mesmos para fins de procriação.

2) Doar os embriões de maneira ,voluntária, anônima e altruista para outro casal infértil, definindo este caminho como uma solução jurídica bilateral na qual para sua formatação é sempre necessário a assinatura de um Termo de consentimento expresso pelo beneficiário e pelo responsável pelo material genético. A idade limite para este procedimento é de 37 anos.

3) Existe também a possibilidade de  realizar doação para pesquisa científica este último ponto menos procurado por não existir uma demanda específica bem como estabelecer diretrizes mais complicadas no âmbito burocrático.

Em resumo, no que se refere a existência de embriões excedentários, é que, na realidade não existe uma Legislação que possa definir e disciplinar de maneira clara e objetiva normas para o melhor controle acerca do abandono ou descarte dos embriões. Sabe-se que é uma demanda sensível para todos aqueles que utilizam os serviçoes de RA no Brasil.

Fica claro então que a sociedade necessita entender, refletir e debater sobre o conceito de abandono de embriões produzidos por técnicas de RHA, reestabelecer protocolos e diretrizes sobre os Termos de consentimento e sua obrigatoriedade, bem como derterminar melhores estratégias para mudar ou aliviar o cenário do acúmulo de embriões abandonados no país (LIMA et al., 2019).

 

Referências:

SIMOPOULOU, M. et al. Discarding IVF embryos: reporting on global practices. Journal of Assisted Reproduction and Genetics, v. 36, n. 12, p. 2447–2457, 2019.

Lima NS, Botti G, Lancuba S, Martínez AG. Abandoned frozen embryos in Argentina: a committee opinion. JBRA Assist Reprod. 2019 Apr 30;23(2):165-168.

ASRM – Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva. Comitê de Ética da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva Comitê de Ética para o descarte de embriões abandonados: uma opinião do comitê. Esteril Fértil. 2013; 99 :1848–1849.

ABREU, C. W. D. P. A. et al. Final destination of surplus cryopreserved embryos. What decision should be made? Jornal Brasileiro de Reproducao Assistida, v. 25, n. 2, p. 276–281, 2021.

Cattapan A, Baylis F. Frozen in perpetuity: ‘abandoned embryos’ in Canada. Reprod Biomed Soc Online. 2016 May 12;1(2):104-112.

LAN, K. C. et al. Evaluation of the effect of the elective blastocyst-stage embryo transfer and freezing strategy on the abandonment of frozen embryos under the Taiwan National Assisted Reproduction Act. Journal of Assisted Reproduction and Genetics, v. 37, n. 4, p. 973–982, 2020.

RESOLUÇÃO CFM (2.320/2022). Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2022/2320.

 

 

Texto- Autores:

Fernando Marques Guimarães – Embriologista Sênior do Instituto Verhum – DF

Fernanda Coutinho Sartori – Biomédica- Especialista em Reprodução Humana Assistida pela Associação Instituto Sapientiae

  • Compartilhe