Análise genética – Quando?
07 nov, 2022
Por Ana Clara Esteves
“Eu não faria análise genética nos meus embriões” “Ah, eu gostaria de saber se o embrião que eu estou transferindo é normal” – Quem nunca ouviu essas frases de colegas de profissão, ou mesmo de conhecidos que não são da área?
A análise genética tem o propósito de revelar a constituição genética de um embrião e, teoricamente, dizer a probabilidade desse embrião formar um bebê saudável. Em linhas gerais, é isso – quer você goste ou não dessa definição.
Mas por que “teoricamente”? Ah! Pois é. O problema é que os resultados da análise genética não são binários. Precisamos lembrar que um laudo de análise genética (seja ela feita em material de biópsia embrionária ou não invasiva) pode nos mostrar resultados plurais.
Um exemplo dessa pluralidade são os mosaicos – aqueles embriões que possuem tanto células cromossomicamente normais como células com alterações cromossômicas – e que podem variar de baixo a alto grau, ou seja, as células anormais podem estar presentes em quantidades variadas. Embriões podem apresentar mosaicismo de baixo grau (20-30%), de grau moderado (30-50%) ou de alto grau (50-70%), e em qualquer um dos casos, é indicado o aconselhamento genético para avaliação do mosaicismo (qual o grau e quais os cromossomos envolvidos), além de avaliação da produção de novos embriões com “melhor prognóstico” (leia-se “euploides”, e pra saber isso precisamos de quê? Isso mesmo, mais uma análise genética).
Outro exemplo de resultados de uma análise genética inclui os embriões que apresentam aneuploidias (trissomias ou monossomia) compatíveis com a vida. As trissomias são caracterizadas pela presença de três representantes cromossômicos onde deveria haver apenas dois, e a monossomia é a presença de apenas um. Existem algumas trissomias compatíveis com a vida – como a Síndrome de Down (21), Síndrome de Kleinefelter (XXY) e Síndrome de triplo X (XXX) -, mas apenas uma monossomia – Síndrome de Turner (X0).
Qual é a polêmica, Ana? Vou explicar: no caso de embriões mosaico (especialmente os de baixo grau), as células sem alterações genéticas podem se replicar de tal forma a “ofuscar” as células com alteração e, dessa forma, gerar um indivíduo saudável. E os embriões com aneuploidias compatíveis com a vida podem gerar indivíduos com alterações fenotípicas e, em alguns casos, hormonais, metabólicas ou cognitivas, mas que podem ter uma vida longa e de boa qualidade, dependendo da alteração. E aí, eu te pergunto: qual o limite do “saudável”? Quem define esse limite?
Eu não sei, e nem me proponho a isso! Aqui, meu propósito é colocar a reflexão: se você recebe um laudo de análise genética somente com embriões mosaico ou com alterações compatíveis com a vida, o que você faz? Descarta, sabendo que esses embriões podem dar origem a bebês “saudáveis”? Ou transfere – e nesse caso, pra que fazer a análise genética em primeiro lugar? Por que não arriscar uma transferência sem análise genética? Até porque aqui nem entramos no quesito dos embriões com resultado inconclusivo (que necessitariam ser biopsiados novamente), nem no de confiabilidade no resultado dessa análise (lembra a eterna discussão dos embriões mosaicos com células normais no trofectoderma – resultado da análise por biópsia como “euploide” – e anormais na MCI – bebê aneuploide? Então…).
É lógico que a análise genética embrionária tem seu espaço! Excluir aneuploidias incompatíveis com a vida, ou embriões com potenciais doenças ligadas ao sexo (dentre outras indicações) pode poupar muitas famílias de uma dor inimaginável. E eu também entendo aqueles que prefiram não transferir embriões com alterações compatíveis com a vida – pois mesmo elas podem requerer adaptações em vários âmbitos. O intuito aqui é dialogar e fazer refletir. É um gasto extra num tratamento que já não possui um preço tão acessível, um processo a mais ao qual o embrião vai ser submetido (no caso da biópsia), e vai revelar informações que podem ser recebidas de várias formas, inclusive causar reflexões que antes não existiam – e é importante ponderar esses aspectos.
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