Compreendendo os desafios da divisão celular após a fertilização: por que algumas clivagens não ocorrem?

26 jul, 2023

Autor: Edson Lo Turco

As falhas na clivagem, ou seja, a incapacidade dos oócitos fertilizados se dividirem em células sucessivas durante a fase inicial do desenvolvimento embrionário, podem ocorrer por várias razões. Na rotina do laboratório de fertilização elas atingem uma pequena porcentagem dos embriões, apenas 3 a 4%, entretanto, para as grandes falhas de clivagem, existem algumas causas que podem dar um norte para o embriologista e o casal entender o que possivelmente ocorreu dentro e fora do laboratório de fertilização in vitro.  Algumas das principais causas incluem:

 

  1. Problemas genéticos: Em certos casos, é possível ocorrer falhas na clivagem embrionária devido a problemas genéticos subjacentes. Esses problemas podem se manifestar como anomalias cromossômicas ou mutações genéticas no óvulo fertilizado, resultando em uma clivagem inadequada. Essas alterações genéticas têm o potencial de interferir nos processos normais de divisão celular durante o desenvolvimento embrionário, resultando em falhas na clivagem. Para determinar se essas alterações genéticas são a causa subjacente, seria necessário realizar testes genéticos nos oócitos e espermatozoides envolvidos no processo de fertilização. No entanto, esses testes genéticos não são amplamente realizados rotineiramente nos laboratórios, pois são normalmente indicados apenas em casos em que houve uma falha completa de clivagem embrionária. Nesses casos, os oócitos podem ser direcionados diretamente para o teste de PGT-A (teste genético pré-implantacional de aneuploidias) para a detecção de possíveis alterações cromossômicas.

 

  1. Idade materna avançada: A idade materna avançada tem sido associada a um aumento na incidência de falhas de clivagem embrionária. À medida que as mulheres envelhecem, ocorrem alterações na qualidade dos oócitos, o que aumenta a probabilidade de problemas durante a fase inicial do desenvolvimento embrionário. Essas mudanças estão relacionadas ao processo de envelhecimento das organelas celulares e a possíveis deficiências na produção de proteínas envolvidas na divisão dos oócitos.

 

  1. Má qualidade dos oócitos: A qualidade dos oócitos desempenha um papel fundamental no desenvolvimento embrionário adequado. A clivagem embrionária, um processo crucial que ocorre logo após a fertilização, pode ser comprometida devido a falhas na qualidade dos oócitos. Embora a idade materna seja um fator bem conhecido que influencia a qualidade dos oócitos, existem outros elementos que também desempenham um papel significativo nesse processo.

Várias condições médicas subjacentes podem afetar negativamente a qualidade dos oócitos. Distúrbios endócrinos, como a síndrome dos ovários policísticos (SOP), podem resultar em desequilíbrios hormonais que afetam a maturação dos oócitos. Além disso, doenças metabólicas, como a diabetes, podem ter efeitos prejudiciais nos oócitos, prejudicando sua capacidade de se desenvolver adequadamente após a fertilização.

A exposição a toxinas ambientais também pode ter um impacto negativo na qualidade dos oócitos. Substâncias químicas presentes em produtos domésticos, como pesticidas, produtos de limpeza e plásticos, foram associadas a danos nos oócitos. Além disso, a exposição a poluentes ambientais, como poluentes atmosféricos e produtos químicos industriais, também pode comprometer a qualidade dos oócitos, levando a falhas na clivagem embrionária.

O estilo de vida e a saúde geral de uma mulher também desempenham um papel importante na qualidade dos oócitos. O tabagismo, por exemplo, tem sido consistentemente associado a uma diminuição na qualidade dos oócitos. Além disso, o consumo excessivo de álcool e uma dieta pobre em nutrientes essenciais podem afetar negativamente a saúde dos oócitos e sua capacidade de se dividir corretamente.

A saúde reprodutiva geral de uma mulher também desempenha um papel crítico na qualidade dos oócitos. Condições como endometriose, doença inflamatória pélvica e anormalidades uterinas podem comprometer a qualidade dos oócitos devido à presença de inflamação crônica ou alterações estruturais no ambiente reprodutivo.

Além disso, processos naturais de envelhecimento, como o declínio da reserva ovariana, também afetam a qualidade dos oócitos. À medida que uma mulher envelhece, a quantidade e a qualidade dos oócitos diminuem, aumentando o risco de falhas na clivagem embrionária e resultando em uma redução nas taxas de implantação e sucesso da gravidez.

Em resumo, vários fatores podem afetar negativamente a qualidade dos oócitos, resultando em falhas na clivagem embrionária. A idade materna, condições médicas subjacentes, exposição a toxinas ambientais, estilo de vida e saúde reprodutiva geral são todos elementos que desempenham um papel significativo na maturação adequada dos oócitos e no subsequente desenvolvimento embrionário. Compreender esses fatores e tomar medidas para otimizar a qualidade dos oócitos pode ser essencial para melhorar as taxas de sucesso da reprodução assistida e a saúde reprodutiva em geral.

 

  1. Fatores ambientais e de laboratório: A clivagem embrionária, pode ser afetada por uma variedade de fatores ambientais e de laboratório. A fertilização in vitro e outras técnicas de reprodução assistida são realizadas em ambientes controlados, e condições inadequadas nesse ambiente podem ter um impacto significativo na clivagem embrionária.

Um fator crítico é a manutenção das condições ambientais ideais durante a FIV. Variações na temperatura podem ter efeitos adversos no processo de clivagem, pois os embriões são sensíveis a mudanças térmicas. Além disso, o pH do meio de cultura desempenha um papel fundamental, e flutuações nesse parâmetro podem comprometer a clivagem adequada.

A disponibilidade de nutrientes essenciais também é crucial para o sucesso da clivagem embrionária. O meio de cultura usado durante a FIV deve fornecer os nutrientes necessários para sustentar o desenvolvimento inicial dos embriões. Alterações na composição do meio ou na concentração de nutrientes podem interferir negativamente na divisão celular e na formação adequada dos blastômeros.

É importante ressaltar que esses fatores ambientais e de laboratório são cuidadosamente controlados e monitorados para otimizar as taxas de clivagem e, consequentemente, melhorar as chances de sucesso das técnicas de reprodução assistida.

 

 

  1. Problemas com o espermatozoide: Embora a clivagem embrionária seja predominantemente influenciada pelo óvulo, deve-se considerar que certas falhas nesse processo podem estar correlacionadas a anormalidades espermáticas. A qualidade e a funcionalidade comprometida dos espermatozoides podem impactar negativamente a clivagem do óvulo fertilizado.

Dentro desse contexto, é relevante ressaltar que a integridade genética e a capacidade de ativação dos espermatozoides desempenham papéis cruciais na clivagem embrionária adequada. Espermatozoides com baixa qualidade, decorrente de fatores como defeitos morfológicos, motilidade reduzida ou danos no DNA, podem prejudicar a interação inicial entre o espermatozoide e o óvulo, afetando a capacidade do óvulo fertilizado de se dividir de forma apropriada.

Além disso, anormalidades cromossômicas presentes no espermatozoide também podem ser uma causa subjacente de falhas de clivagem embrionária. A ocorrência de aneuploidias ou rearranjos estruturais nos cromossomos espermáticos pode levar a erros na segregação dos cromossomos durante as primeiras divisões celulares, comprometendo o desenvolvimento embrionário subsequente.

Essas evidências destacam a importância do espermatozoide na clivagem embrionária e na viabilidade do embrião. Portanto, compreender e abordar os potenciais problemas relacionados aos espermatozoides é fundamental para melhorar as taxas de sucesso em técnicas de reprodução assistida e aumentar a compreensão dos mecanismos subjacentes à formação e desenvolvimento embrionário.

Em conclusão, é essencial reconhecer a singularidade e complexidade de cada caso de falha na clivagem. Embora a causa exata dessas falhas nem sempre possa ser identificada, é importante compreender que elas são relativamente comuns e podem ocorrer em diferentes estágios do desenvolvimento embrionário. Quando essas falhas são detectadas, podem resultar em problemas como falha de implantação, embriões inviáveis e, consequentemente, complicações de fertilidade ou abortos espontâneos. A compreensão desses aspectos é fundamental para o desenvolvimento de abordagens mais eficazes no tratamento da infertilidade e no suporte a casais que enfrentam essas dificuldades.

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