Morfologia Oocitária Ruim. Vale a Pena Trabalhar?
06 mar, 2023
Por Françoise Elia Mizrahi, Diretora Projeto Alfa
A qualidade dos óvulos é um fator muito importante na fertilidade feminina.
A competência oocitária pode ser definida não apenas com a maturidade nuclear mas conjuntamente com a maturidade citoplasmática.
A maturidade nuclear é caracterizada pela presença do 1ºcorpúsculo polar que confere ao óvulo o título de MII-Metáfase II.
A maturidade citoplasmática envolve regimes estruturais, dentre eles o suprimento de energia, e moleculares.
Ambos os processos podem apresentar deficiências isoladamente causando um comprometimento à fertilização e qualidade embrionária como conjuntamente apresentando disformismos oocitários.
É comum ter alteração nos óvulos?
Sim. Cerca de 60-70% dos óvulos recuperados tem alteração. As alterações podem ser resultado de fatores intrínsecos, como a idade da paciente, e/ou de fatores extrínsecos associados como os protocolos de estimulação ovariana controlada e à resposta de cada paciente ao tratamento. A maioria dos óvulos recuperados após estimulação apresenta uma ou mais variações; isso é muito comum e é inclusive encontrado em pacientes férteis que doam óvulos.
Os óvulos podem apresentar alterações dentro (intracitoplasmático) e fora do citoplasma (extra citoplasmático).
Dependendo da alteração, localização, quantidade pode se tornar mais ou menos grave.
E quais são essas alterações? Todas valem a pena serem manipuladas? No que devemos ficar atentos?
Alterações Extracitoplasmáticas
- Espaço Perivitelineo (EPV)-estrutura fluida entre a membrana plasmática e a zona pelúcida
Quanto maior a maturidade do oócito maior o grau de expansão do EPV.
- Zona Pelúcida (ZP)- matriz de glicoproteínas, polissacarídeos e proteínas específicas, que envolve e protege o óvulo e o embrião no início do desenvolvimento.
A ZP pode ter várias alterações, mas as que podem acarretar maiores prejuízos são:
Ter uma espessura muito grande (pode chegar a 30um) quando o ideal é entre 15 a 20um. Nesses casos é possível fazer o Assisted Hatching.
Se a ZP estiver muito alongada o embrião formado terá dificuldades para que suas células se comuniquem (diferente do que ocorre quando o óvulo tem diâmetro normal), essa falta de interação celular pode causar atraso na formação e na expansão do blastocisto.
E o mais grave de todas, a ZP pode estar rompida. Nesses casos não há o que fazer porque o citoplasma está perdido. Isso pode ocorrer por um problema do próprio óvulo ou devido a uma pressão muito alta (raro acontecer quando há controle de qualidade correto) durante a aspiração dos óvulos. Outras alterações, como estar mais escura (filamentos mais aderidos), mais rugosa, mais septada não interferem nos resultados e não necessitam de alguma intervenção técnica.
- Corpúsculo Polar (CP) – célula filha com 23 cromossomos e 46 cromátides, gerada após a telófase da primeira divisão meiótica.
O tamanho do CP, assim como o tamanho do óvulo, pode ser considerado uma grave alteração por indicar uma maior chance de aneuploidia devido a um erro de distribuição genética durante a meiose. Em óvulos com essas características é aconselhável:
- Manipular se houver poucos óvulos
- Cultivar embriões oriundos desses óvulos até o estágio de blastocisto (mais uma seleção natural que permitirá saber se o embrião consegue se desenvolver até esse estágio)
- Fazer o estudo genético com enorme possibilidade de aneuploidia ou deixar paciente ciente que a chance de gestação é menor e de aborto maior. Indicar não significa que É.
- Congelar a critério de decisão conjunta entre paciente e clínico
Outra característica do CP é ele estar fragmentado, mas isso é normal; a maioria dos CP, após a ovulação ficam fragmentados após algumas horas.
Alterações Intracitoplasmáticas
- Vacúolos -São inclusões citoplasmáticas (substâncias intracelulares acumuladas no citoplasma que não realizam nenhuma atividade metabólica e não estão unidas a membranas) cheias de liquido.
O que causam?
Quando são grandes ou em grande quantidade espalhados faz com que os fusos meióticos de desloquem de suas posições.
Ocorre uma maior falha de fertilização (<20% quando tem vacúolos grandes) e de divisão celular.
- Granulação
A granulação pode ser homogênea e estar presente em todo o citoplasma ou pode ser localizada e central. Quando localizada e central está associada a um pior prognóstico.
E quanto ao congelamento? É seguro congelar óvulos?
Usando a técnica da vitrificação para evitar formação de gelo intra celular, respeitando o tempo de equilíbrio (um curto tempo de exposição a solução de equilíbrio pode levar a um choque osmótico), respeitando o tempo para vitrificar e respeitando o tempo para o spindle se recompor totalmente pós descongelamento, há meta análises mostrando não haver risco em congelar óvulos MADUROS.
Vale lembrar que as alterações citoplasmáticas dos óvulos aparecem com bastante frequência, sabemos quais são, sabemos como agem mas não sabemos muito mais do que a literatura tem nos fornecido nos últimos anos, o quanto essas alterações interferem na competência embrionária. É importante sempre avaliar se é uma característica de um ou de todo o “pool” de óvulos e se essa característica se repete.
Todos os tratamentos devem ser personalizados. Como dizer para uma paciente com apenas um óvulo que o mesmo deve ser descartado? Ou em casos onde nem todos são manipulados quais escolher?
Estando em MII e com as informações acima fica mais fácil entender, selecionar, explicar.
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