O RISCO (POUCO DITO) DO PAI-AVÔ

08 nov, 2023

A idade materna avançada é sempre tema de muita discussão. Mas pouco se fala sobre a idade paterna avançada. E por que isso? Por que, quando o assunto é gerar filhos, os cabelos brancos pesam mais para ela e menos para ele? O relógio biológico responde: enquanto os homens mantêm a produção espermática diária, nas mulheres o estoque de gametas se esgota. Daí um fenômeno muito comum: os chamados “pais-avôs”.

A percepção é que pouco se debate acerca dos riscos deste tipo de paternidade. Assim como para as mulheres, existem consequências para a prole de homens mais velhos. Essa discussão é recente. Antigamente não existiam tantos estudos abordando os perigos da paternidade avançada.

Mas qual a idade de um pai-avô: 40, 50, 60, 70, 80, 90 anos…?

Na regulamentação brasileira a idade máxima permitida para a doação seminal caiu de 50 para 45 anos. Seria esta, então, a idade para um ponto de corte?

Ponto de corte para ter filhos? Não. Mas sim, para entender que a partir desta idade aumenta-se o risco de prole com alterações genéticas. E isto pode ser um motivador educacional para o nascimento de descendentes saudáveis em tenra idade. No entanto, assim como as mulheres, os homens também estão optando em postergar a paternidade pelo desejo de “curtir” a vida, viajar, trabalhar longas horas, acumular “fortunas”, criar coragem para sair da casa dos pais e, finalmente, encontrar a mulher que valha a pena para ele se tornar PAI.

Esta é uma provocação que pode servir de reflexão.

O homem com mais de 40 anos de idade tem a probabilidade aumentada de danos cientificamente demonstrados na prole (ver tabela).

Fonte: Fertility in the aging male: a systematic review

 

Outros estudos revelam que homens a criança tem até três vezes mais chance de desenvolver esquizofrenia quando o pai tem mais de 50 anos de idade. Os riscos seguem aumentados para transtorno do espectro autista, má formação cardíaca, bipolaridade, neurofibromatose, acondroplasia (nanismo), retinoblastoma, várias síndromes que afetam a formação craniana, dentre outros.

Muitos homens não se preocupam pelo simples fato de desconhecerem esses riscos. O aconselhamento médico deveria existir desde muito cedo. Homens não têm o hábito de acompanhamento urológico, assim como as mulheres têm com o ginecologista, anualmente.

 

Os possíveis danos desse pai-avô não aparecem só na prole, mas também na qualidade seminal:

 

– Aumento da fragmentação de DNA espermático;

– Aumento das espécies reativa de oxigênio (ROS);

– Diminuição do volume seminal;

– Diminuição da concentração;

– Diminuição da motilidade; e

– Diminuição da morfologia.

 

Os estudos não são unânimes na concordância da alteração dos parâmetros seminais com o avançar da idade. Importante ressaltar que mesmo com as modificações ocorridas no sêmen, a infertilidade pode não estar presente no casal.

Mais uma provocação: será que esta redução na qualidade seminal não seria uma estratégia da natureza para dificultar a gestação espontânea, como reforço das Leis Evolutivas das espécies?

 

Diante deste cenário, seria prudente e justificável que os homens também fossem informados sobre a importância da preservação da fertilidade. Existe já um marketing consolidado em relação ao congelamento dos óvulos das mulheres – um procedimento mais complexo do que o seminal.

 

O congelamento seminal seria uma estratégia bem simples, mas implicaria num tratamento de reprodução assistida no futuro, mesmo diante de uma ausência de fator de infertilidade do casal. Infelizmente, não há possibilidade de congelar o sêmen, mantê-lo armazenado e devolver na mão do paciente para ele engravidar sua esposa em casa quando quiser.

 

Ficam reflexões (desconsiderando o fator idade materna, ou qualquer outro fator feminino):

1 – O risco de ter filhos com anormalidades justifica o congelamento seminal, em massa, em idade jovem?

2 – Mesmo tendo vida sexual saudável e ativa em idade avançada, seria indicado o congelamento do sêmen em idade jovem, e depois expor o casal a um procedimento de reprodução assistida?

3 – Qual seria a idade segura para congelamento seminal?

4- Um homem que opta pela vasectomia, seria interessante armazenar seus gametas criopreservados na idade da vasectomia, caso ele encontre um novo amor e deseje ser pai novamente com idade ainda mais avançada?

5- A criopreservação seminal não está isenta de danos. Estes seriam inferiores aos danos do sêmen de idade avançada?

 

O fato é que muitos dos danos transmitidos para a prole devido à idade paterna baseiam-se nas altas taxas de mutação gênica. Isso ocorre por conta das inúmeras rodadas mitóticas e meióticas da espermatogênese, assim como da presença aumentada de espécies reativas de oxigênio e das fragmentações do DNA espermático – que geram a diminuição dos mecanismos de reparo genético.

 

Em resumo: os homens deveriam ser mais bem informados sobre os riscos de serem pais-avôs e orientados acerca das vantagens da paternidade com gametas mais jovens, sendo o congelamento seminal uma alternativa a ser apresentada.

 

 

Bia Mattos
Embriologista sênior da Huntington Brasília

 

 

Referência bibliográfica:

Impact of advanced paternal age on fertility and risks of genetic disorders in offspring. Genes, 2023. 14, 486.

 

Fertility in the aging male: a systematic review. Fertil Steril, 2022- Dec, vol.118, Nº6, 1022-1034.

 

Advanced paternal age: effects on sperm parameters, assisted reproduction outcomes and offspring health. Reproductive Biology and Endocrinlogy, 2020, 18:110.

 

Management and couseling of the male with advanced paternal age. Fertil Steril, 2017- Feb, vol.107, Nº2, 324-328.

 

Effects of aging on the male reproductive: review. J.Assit Reprod Genet ,2016, vol.33, 441-454

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